domingo, 1 de dezembro de 2013

Resenha "A Culpa é das Estrelas" - John Green


“Tentei me convencer de que poderia ser pior, que o mundo não era uma fábrica de realização de desejos, que eu estava vivendo com câncer e não morrendo por causa dele, que eu não deveria deixar que ele me matasse antes da hora…"

O best seller "A Culpa é das Estrelas" tem a total permissão para estar na lista dos mais vendidos e agradar todo mundo que lê a história da adolescente Hazel Grace e seu convívio - nada fácil - com o câncer.
Para começar, Hazel é uma daquelas personagens que você simpatiza logo de primeira, porque ela não está tentando lutar contra a doença e nem se manter otimista, mas tem aquele humor picante de quem espera a morte como se fosse algo natural na vida das pessoas. No livro de 288 páginas, ela é uma paciente terminal que precisa viver diariamente com um tanque de oxigênio que ela leva em um carrinho, para respirar através de uma cânula nasal, por conta de um câncer na tireoide que resultou em metástases em seu pulmão. Para não dizer que seu estado é terrivelmente sofrível, ela consegue - com a ajuda de uma médica que, apesar de aparecer poucas vezes, faz com que você imagine uma pediatra sorridente que cuida apenas de bebês, de tão fofa e atenciosa que ela é - retardar o processo dos tumores pulmonares por meio de um remédio forte e experimental que milagrosamente dá certo com ela.
Também somos apresentados a sua mãe superprotetora e seu pai sensível, que a amam incondicionalmente e vivem por ela. A sra. Lancaster é sua verdadeira enfermeira, e é possível sentir a angústia da Hazel quando ela reclama que seus pais não vivem a vida deles para cuidar dela. A relação com o pai é bem parecida, exceto que ele chora em quase todas às vezes que Hazel tem algum problema e precisa ir para o hospital ou que ela se rebela contra a doença. Mas mesmo assim, você os ama logo de cara.
Além dos pais, somos apresentados ao Grupo de Apoio, bem típico nesse tipo de história. É claro que por Hazel ter contraído o câncer com apenas 13 anos e ter sobrevivido três anos mais, seus pais iriam querer que ela não ficasse depressiva e tivesse pelo menos um protótipo de vida normal. Já que ela largou a escola para frequentar a Faculdade Comunitária de Indiana, a MCC, Hazel passa a maior parte de seu tempo assistindo America's Next Top Model ou lendo o seu livro favorito Uma Aflição Imperial, sua mãe incentiva ela a frequentar o Grupo de Apoio e fazer amigos. Mas é claro que logo de início vemos que Hazel está confortável com a ideia de sua própria morte e não quer ser que nem o líder do grupo Patrick, que sempre parece irritantemente otimista. É também nessa roda de apoio de crianças com câncer que Hazel conhece o atraente Augustus Walters, amigo de Isaac, que tem câncer nos olhos.
O encontro com Augustus marca praticamente uma nova fase na vida de Hazel. Ele fica fascinado por ela, e apesar da garota achar que é como se fosse uma "granada" - prestes a explodir e acabar com todos a sua volta - a amizade entre os dois evolui gradativamente. Entre muitos momentos sinceros entre Gus e ela, os dois acabam viajando para Amsterdã para encontrar o autor favorito de Hazel - aquele do livro Uma Aflição Imperial - e acabam passando por algo completamente diferente do esperado. É depois dessa viagem que ela descobre que Augustus, que estava SEC (sigla para sem evidência de câncer) há mais de um ano após ter contraído osteossarcoma, juntou-se a ela no "estado terminal" por causa do câncer. Apesar de ser um garoto carismático e extremamente adorável, Augustus tem um medo constante de cair no esquecimento, assim como Hazel tem medo de magoar todo mundo se envolver-se demais. Os dois descobrem certas brechas que o Universo dá aqueles que precisam sentir que a vida vale a pena. Não é só o amor verdadeiro e nem o entendimento mútuo que os une, mas a possibilidade de aprender um com o outro e crescerem enquanto estão juntos. John Green soube lidar interessantemente com a questão de uma doença terminal, pois apesar da história em si ser muito tocante, os personagens lidam com isso de maneira cômica o tempo todo. Nós podemos conhecer os medos da Hazel e as aflições do Gus, que combinam muito e se completam. É um livro muito bonito e que no fim das contas, ensina sobre o infinito e sobre o "viver agora". 

terça-feira, 2 de julho de 2013

Resenha "A Sangue Frio” – Truman Capote

"Mas quando a multidão viu os assassinos, com sua escolta de policiais rodoviários de casaco azul, ficou em silêncio, como se espantada de constatar que os dois tinham forma humana.”

“A Sangue Frio” é considerado um romance não ficcional pelo seu autor, o jornalista Truman Capote.  “Não ficcional” por ser um livro baseado em fatos reais, ou seja, o assassinato que ocorreu em 1959 na cidade Holcomb, no Kansas e que matou quatro membros de uma família muito popular e adorada pelos habitantes da pacata cidade.
O romance busca se aprofundar no assassinato e na perseguição que se deu aos assassinos após o Xerife de Holcomb e os detetives de outras cidades dos EUA entrarem no caso. Truman Capote decidiu cobrir o caso na época, e teve acesso a diversas fontes e materiais cruciais para a criação de seu livro, porém quem lê com atenção a primeira grande obra do “New Journalism”, percebe que algumas coisas parecem fantasiosas demais, como se o narrador fosse onipresente e estivesse em todas as cenas por trás do assassinato dos Clutter.
Mesmo assim, as inúmeras aspas que preenchem o livro, dão ao leitor a sensação de que se trata mesmo de um relato jornalístico, pois Truman conversou com muitas pessoas – envolvidas ou não – no crime em questão. Isso pode se tornar meio cansativo, ainda mais quando as vítimas já são consideradas mortas desde o início do livro, quando o autor dá pistas muito claras das causas e do fim de algumas personagens. Para quem procura um romance policial tradicional que prenda a atenção, terá que se contentar com essas pequenas “confissões” que entregam de cara quem morre.
O ponto alto do livro é a profundidade em que Capote passa ao apresentar os dois assassinos, que têm um ponto de vista próprio ao longo do livro e assim, o leitor pode acompanhar a vida dos Clutter e o planejamento e a rotina dos dois assassinos. Truman também consegue passar muito mais intensidade na personalidade de Perry Smith e Dick Hickcock, os criminosos da história, por ter passado muito tempo coletando dados e informações de ambos, do que os habitantes de Holcomb, o que faz o leitor se aproximar do passado de cada um e se possivelmente sentir compaixão com a história dos infelizes criminosos.
Os moradores de Holcomb são constantemente postos em cena, para exemplificar o sentimento que toda a cidade passa em relação ao assassinato, como a mulher do xerife, que antes queria morar no interior assim como os Clutter, e após o assassinato prefere ficar onde mora. Os habitantes são importantes partes para que a história se faça presente, pois é a partir dos diálogos relatados por alguns dos mais próximos da família Clutter, que os quatro falecidos podem ser representados como eram.
O livro, que não usa uma narrativa necessariamente linear, busca explicar o porquê dos criminosos terem invadido a casa dos Clutter e, após não encontrarem o suposto cofre que os deixaria ricos, matarem os quatro integrantes e fugirem de todos sem demonstrarem remorso algum após isso. O leitor tem a oportunidade de entrar na mente de dois psicopatas e tentar entender o que de fato se passou na cabeça de ambos para um assassinato literamente “a sangue frio”.
Parte das investigações acerca do gênero “não ficcional” do autor, que passou cerca de um ano em Holcomb para cobrir toda a história, é justamente porque Truman Capote não utilizava nada para recordar suas entrevistas, a não ser sua própria memória. Com sua própria técnica, ele consegue descrever de cabeça todos os seus diálogos e informações obtidas com as fontes que dão voz ao livro. O leitor é capaz, portanto, de tirar várias perguntas do livro, como por exemplo, o porquê do foco ser os assassinos e não a família assassinada. Se buscar entender o ponto de vista do ilustre autor, pode encontrar um passado problemático com a própria família, e assim tentar compreender o motivo pelo qual Truman se “afeiçoou” tanto com os dois assassinos e principalmente com Perry Smith, que ganha um espaço visivelmente maior de relatos no livro do que os outros personagens.

Para mentes curiosas, há um filme que deu um Oscar ao ator Philip Seymour Hoffman e foi lançado em 2005, com o título de “Capote”, onde o foco principal é a criação do livro jornalístico e pode dar uma visão mais ampla ao leitor das artimanhas que o autor usou para escrever.

FICHA TÉCNICA: (edição mais nova)
Edição: 1
Editora: Companhia das Letras
Ano: 2003
Páginas: 440
Tradutor: Sergio Flaksman

Resenha "Uma Curva da Estrada" - Nicholas Sparks

Uma coisa ela havia aprendido: a vida raramente segue nossos planos.” 


Para uma leitora assídua de Nicholas Sparks, o livro "Uma Curva da Estrada" surpreende. É claro que há muitos pontos padrões ao longo do livro, que são mostrados logo de início, mas o seu desfecho é uma surpresa para quem está acostumado com os finais felizes e quase clichês de Sparks.
O livro conta a história de vida do subxerife de New Bern (Carolina do Norte, EUA), Myles Ryan e seu filho Jonah, de apenas sete anos de idade, que perdem simultaneamente Missy, a esposa e mãe dedicada. Até então, a morte é um mistério. O que se sabe é que Missy foi correr de noite e foi atropelada por alguém que se sentiu culpado demais para cobri-la com um manto branco e fugir sem prestar queixa. Isso é suficiente para que Myles veja sua vida completamente destruída e sem sentido, começando a fumar e a viver de modo automático, preocupando seus amigos mais íntimos. É doloroso ver seu sofrimento e acompanhar a sua culpa diária; além de perder a esposa que fora sua primeira namorada nos tempos de colégio, ele não conseguiu solucionar o caso e nem muito menos a polícia. O suspeito é uma icógnita pesarosa tanto para o leitor, quanto para o próprio personagem principal.
O ponto alto do livro começa quando Sarah Andrews é apresentada, a professora de Jonah, que se mudou de Baltimore para New Bern para recomeçar sua vida. O personagem dela relembra algumas outras personagens Sparkianas, como Katie, de "Um Porto Seguro", que também muda de cidade à procura de recomeço. Porém, diferentemente de Katie, Sarah não tem um passado trágico, e só é contado o motivo de sua mudança no meio do livro, quando o autor se aprofunda mais em sua vida. Como de costume, o padrão de um personagem órfão e/ou com um familiar só fica no papel de Myles, que tem um pai ausente, enquanto Sarah é membro de uma família calorosa e grande, e sua mãe aparece muitas vezes ao longo do livro, dando-lhe conselhos e sendo o seu oposto, como acontece muito nos livros do Nicholas Sparks. 
Sarah é um importante meio de aproximação e elo entre Jonah e Myles, quando repara nas dificuldades de aprendizagem que o filho do subxerife apresenta na escola e que foram negligenciadas pelos outros professores. Ela chama então Myles para uma conversa e propõe aulas particulares de reforço para o menino, e aí é onde a pequena chama se acende entre os dois. De início, o subxerife não admite para si mesmo que pode estar pensando em Sarah, pois está sozinho há muito tempo e não se sente muito confortável com a ideia, mas é levado ao clima de romance inevitável entre os dois. Essa parte é uma das minhas preferidas, pois o começo de qualquer relacionamento é envolvente em qualquer situação. E nesse caso em específico, é engraçado e apaixonante ver Myles tentando se aproximar de Sarah e convidá-la para sair de modo tímido, quase como se ele fosse um adolescente. Sarah se mostra um personagem muito divertido e inteligente, então sentir empatia por ela não é muito difícil. O romance dos dois se desenrola ao mesmo tempo em que novas pistas vão surgindo sobre o caso de Missy. Surpreende muito a forma em que Nicholas Sparks se arriscou em um romance quase policial, e digo quase porque não teve aprofundamento e mistério o suficiente, mas para uma primeira vez prendeu a minha atenção muito bem. Aparecem cartas misteriosas do assassino, logo de início, mostrando o quanto ele se arrependeu e se sente confuso com a história toda. Os pontos de vista que podemos ter passam de "este cara é um lunático" a "é uma criança sozinha e confusa", mas se o leitor prestar bastante atenção mata a charada antes mesmo de Myles descobrir. O subxerife passa pelos dramas do livro, fica desatento em relação à Jonah e negligencia a nova namorada Sarah, e é nessa parte que você não consegue parar de ler. Primeiro porque a relação entre Jonah e Myles é muito próxima e segundo porque a evolução do namoro com Sarah se tornou cada vez mais sólida à medida que Myles deixou que ela cuidasse de suas feridas e vice-versa. 
O assassino aparece se denunciando nas cartas anônimas que preenchem o livro. Até então, ninguém suspeitava, mas quando é revelado o seu segredo muitas coisas são postas em jogo. Fiquei me vendo na situação de todos os personagens nesta hora e o que faria se fosse cada um deles. Acho que essa é a graça ao ler Nicholas Sparks e sentir o suspense em que ele termina cada capítulo. O assassino por fim, é quase como o personagem chave para que tudo se resolva na vida de Myles. Ele pode, ou não, deixar de lado os dois anos de investigações sobre a morte de Missy, como também "vingar-se" como subxerife. Aqui fica também ao encargo do leitor sua visão sobre a decisão final de Myles, que surpreende mesmo. Fiquei pensando que foi heróico, mas ao mesmo tempo muito arriscado estar na pele do culpado na hora H. 

No fim, a mensagem que o livro aborda é exatamente as imperfeições existentes no homem e como o amor modifica isso nas pessoas. Os erros que cometemos muitas vezes são perdoados se a outra pessoa nos enxerga como seres capazes de cometer burrices o tempo todo e talvez seja por isso que o livro me surpreendeu tanto. Foi sobre amor, mas isso foi um tema secundário ao longo da história. Em "Uma Curva da Estrada" somos apresentados aos pesadelos diários de um homem apaixonado que perdeu sua mulher. Na cidadezinha estilo interior de New Bern, podemos ver que o caminho fácil era simplesmente se deixar engolir pela rotina automática, mas que a presença de um novo amor mudou-o porquê ele mesmo permitiu isso. Há pessoas que passam em nossas vidas com um papel intenso de modificar nosso próprio jeito de ser, e Nicholas Sparks conseguiu exemplificar muito bem essa verdade em seu livro.

FICHA TÉCNICA:
Edição: 1
Editora: Arqueiro
Ano: 2013
Páginas: 304
Tradutor: Fernanda Abreu